quinta-feira, 3 de julho de 2008

Um “imposto invisível” que custa os olhos da cara

MINHA COLUNA NA TRIBUNA DA IMPRENSA DE 4 DE JULHO DE 2008 “Cinco famílias têm direito ao domínio útil de Botafogo, o que é uma loucura”. Regina Chiaradia, da Associação dos Moradores de Botafogo. Nestes tempos bicudos em que o brasileiro tem de morrer numa baba em impostos – mais 1/3 da sua renda – gostaria de indagar numa boa, até porque, como consta do ditado, perguntar não ofende: por que até hoje somos penalizados com essas taxas de laudêmios e enfiteuses, entulhos do arco da velha, que sobrevivem a séculos por cima de pau e pedra? Sabe do que estou falando? Coisa da corte portuguesa, dos tempos coloniais, que atravessou independência adentro no primeiro reinado e pegou pesado até hoje, sem que ninguém consiga derrubar, embora todo mundo pense como o advogado tributarista Melhin Chalhub, para quem “a União cobrar isso em pleno século 21 é injustificável, por ser uma invenção da Idade Média”. A União? Menos. O próprio Chalhub lembra que em Niterói, o Asilo de Santa Leopoldina, por exemplo, ainda recebe laudêmio pela maioria dos imóveis construídos em Icaraí, um dos bairros mais nobres dessa simpática cidade. Pelos cálculos do advogado Francisco Neto, de São Paulo, a União Federal possui e detém apenas 30% das terras aforadas, enquanto a Igreja Católica possui 60%, ficando o restante com particulares e com herdeiros da família imperial brasileira. Antes que você vire a página e me deixe aqui falando sozinho, vou logo explicando: quem vende imóvel nas áreas onde vigora o laudêmio, paga nada menos de que 5% do seu valor para uma espécie de sócio oculto. Só no Rio de Janeiro, pelos cálculos da Secretaria Nacional de Patrimônio, 50% do seu território sofrem com essas taxas que enchem as burras da União, da Prefeitura, de ordens religiosas e de famílias que ganharam essa boca desde as sesmarias, quando a cidade foi dividida em lotes no Primeiro Reinado, em 1831. Isso numa tremenda balbúrdia: primeiro, porque ora cobram pelo valor do solo, ora incluem as construções. Depois, no caso dos terrenos de marinha, ninguém se entende sobre quem está nos 33 metros definidos naquele 1831 como de proteção militar. Tem imóvel na Av. Lúcio Costa, construído há menos de 10 anos, que não está cadastrado. Outros, na mesma beira mar, por mais antigos, não são peixes, mas caíram na malha. Em 2006, houve até uma audiência pública na Associação Comercial do Rio de Janeiro, quando alguns deputados federais prometeram mover céus e terras para mudar a Constituição e acabar com esse “imposto invisível”, que nos pega no contrapé. Era ano de eleição para o Congresso e depois ficou por isso mesmo, até porque, como dizem os juristas de fino trato, essa é “matéria infraconstitucional” – isto é, o buraco é mais embaixo - não tem nada a ver com a dourada Carta Magna. Os donos de Botafogo No bairro de Botafogo, a Associação de Moradores entrou com uma ação civil pública para livrar 30 mil proprietários da São Clemente e adjacências do pagamento dessa taxa à família Silva Porto, que tem o direito real adquirido pelo sistema de sesmarias feito na época do Primeiro Reinado. A presidente da associação, Regina Chiaradia, constatou que a taxação levou muitos aposentados a venderem os imóveis para quitar as dívidas com os Silva Porto, considerados enfiteutas (pessoas que recebem o valor do domínio útil de um prédio). - Acredito que cerca de 50 a 60 mil pessoas pagam essas taxas seculares no bairro todo, algumas delas sem saber direito o que é – disse ao JB em 2006. E o governo federal, o que tem a dizer? Como sempre, esse, como qualquer outro, se puder nos arranca o olho da cara e nos deixa a imaginar navios na beira da praia. Em todas as ações contra a cobrança dessa grana, a Advocacia Geral da União questiona até sua autoria. Porque é dinheiro que não entra no catálogo das reclamações com impacto político. E leva milhares de pessoas à rendição incondicional. Afinal, neste país, o senso crítico foi substituído pelo jeitinho brasileiro: no lugar de reagir contra a extorsão, o cidadão procura uma forma de burlá-la e fica tudo por isso mesmo. Uma prática do tempo que os portugueses estavam por cima da carne seca foi sacramentada no primeiro reinado, mantida no Código Civil republicano de 1916 ( artigos 678 e 680) e ainda ganhou forma de “regulamentação” com os Decretos-Leis 2490, de 1940 e 2398, de 1987. Pelo artigo 26, parágrafo 1° do decreto do Doutor Getúlio, “todas as transferências onerosas, quaisquer que sejam suas modalidades, estão sujeitas ao pagamento de laudêmio”. Pelo artigo 3º do Decreto de 1987, assinado pelo Doutor Sarney, “dependerá de prévio recolhimento do laudêmio, em quantia correspondente a 5% do valor atualizado do domínio pleno e das benfeitorias, a transferência onerosa, entre vivos, do domínio útil”. E a farra continua A cobrança– mais do dobro do ITBI municipal - foi calorosamente debatida na última Constituinte, que abriu caminho para o seu fim através do artigo 49 de suas Disposições Transitórias: "A lei disporá sobre o instituto da enfiteuse em imóveis urbanos, sendo facultada aos foreiros, no caso de sua extinção, a remição dos aforamentos mediante aquisição do domínio direto, na conformidade do que dispuserem os respectivos contratos." Com a aprovação do atual Código Civil, que passou a vigorar em 11 de janeiro de 2003, a enfiteuse deixou de ser disciplinada e foi substituída pelo “direito de superfície”. O seu artigo 2.038 proibe a constituição de novas enfiteuses e subenfiteuses, subordinando-se as existentes, até sua extinção, aos princípios do Código Civil de 1916. Nada mudou até hoje, no entanto. Que o digam os moradores da Urca à Sepetiba, do Flamengo à Ilha do Governador, que pagam à União 5% do valor do imóvel a cada venda ou do Castelo (no Centro), que são “sócios” da Ordem Terceira da Penitência. Ou os proprietários dos prédios do Pátio do Colégio, em São Paulo, de toda a cidade de Petrópolis (nas mãos dos herdeiros do imperador) ou da cidade de Tombos, em Minas Gerais, que são “devedores” da Igreja. E olha que poucas são as legislações no mundo que ainda abrigam esse arcaísmo histórico. Não sei quantos estão interessados em entrar nessa briga contra laudêmios, enfiteuses, foros e outros bichos que corroem nossos orçamentos. Mas eu acho que esta é uma boa oportunidade para questionar, até porque estamos às vésperas de eleições municipais e precisamos modernizar a legislação sobre o uso do solo, sob pena de produzir uma crise de moradia igual a que levou os norte-americanos à lona. coluna@pedroporfirio.com

5 comentários:

ivoviuauva disse...

Excelente o artigo sôbre o Bolsa-laudêmio, fico deveras satisfeito por ver atendido a minha sugestão sôbre tão escroncho imposto idem a sociedade.

ivoviuauva disse...

Excelente artigo sôbre BOLSA-LAUDÊMIO, E LISONGEADO POR TER VISTO MINHA SUGESTÃO SÕBRE O ASSUNTO SER ACOLHIDO

Anônimo disse...

comprei um imovel na rua real grandeza, em 2000 e paguei laudemio à Prefeitura. Nunca recebi nenhun tipo de cobrança da familia requerente, mas caso venha a ser cobrada, isso nao seria bi tributação? até onde sei isso é ilegal....

Anônimo disse...

O laudênio e outras impostos, nos tiram os olhos da cara e ficamos até sem "ver navios",pior que pagar é não receber o retorno do que pagamos em forma de serviços.
Jileno.

Unknown disse...

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