MINHA COLUNA NA TRIBUNA DA IMPRENSA DE 25 DE JULHO DE 2008
“Temos que criar regras que viabilizem o processo democrático. A internet é um instrumento mais barato, é impossível barrar esse processo. Muito mais difícil é a fiscalização”.
Juiz Luiz Márcio Pereira, responsável pela coordenação-geral da fiscalização da propaganda eleitoral do TRE-RJ.
O maior crime que se comete contra a democracia tida e havida como representativa é tornar clandestina uma campanha eleitoral. No entanto, tal prática parece institucionalizar-se, com a criminalização das mais variadas formas de propaganda, sempre encoberta por pretextos nobres, que, no fundo, no fundo, são autênticas arapucas contra o voto livre, o voto de opinião, alimentando o mais abjeto clientelismo, o peso da máquina pública e as coações localizadas.
Quem se debruçar sobre essa colcha de retalhos ainda chamada de Lei 9504/97 (parece um transgênico com vários enxertos) terá à mão a aquarela da manipulação pintada por políticos que jogam pesado para continuarem com seus mandatos, por incompetentes anacrônicos e até por uma hermenêutica judicial que, por bem ou por mal, estimula a queda do nível dos nossos parlamentos, especialmente os municipais.
A aplicação ao pé da letra da Lei Eleitoral e das Resoluções do TSE e do TRE implica na inviabilização das campanhas voltadas para os eleitores que escolhem por critérios críticos. Porque se ainda há lucidez na interpretação de alguns juízes, particularmente os que acumularam experiência com outras campanhas, de um modo geral os candidatos estão sujeitos a tal contingenciamento na divulgação de suas propostas que acabam impedidos de alcançar esse eleitorado infenso à troca de votos por favores.
O resultado é festejado principalmente pelos que querem que os legislativos sejam meros apêndices do Poder Executivo e valhacoutos de interesses espúrios, dedicados a um jogo de péssimos hábitos, com o que isso representa para o enfraquecimento e caricaturização do regime democrático de direito.
Opinião calada
Uma reportagem criteriosa assinada por Fábio Vasconcellos e Elenilce Bottari, no jornal O GLOBO do último domingo, dia 20, demonstra claramente que o eleitor de opinião está cada dia mais distante da escolha dos vereadores, abrindo espaço para a ascensão dos padrinhos de “serviços sociais” clientelistas mantidos sabe Deus como, pelos controladores das máquinas públicas, pelos pastores e padres “carismáticos” e pelos bandos armados – “milicianos” ou não.
A matéria não deixa dúvidas: “Há uma tese, bastante difundida, de que, quanto mais informado e escolarizado o eleitor, maior é a probabilidade de ele se interessar por política. Se a hipótese não estiver incorreta ou desatualizada, há algo a ser descoberto no Rio. Região onde estão aqueles com os melhores níveis de formação, a Zona Sul abriga os eleitores que mais abrem mão de escolher vereadores. Descrença nos candidatos ou falta de interesse nas eleições, o fato é que a soma das abstenções, votos nulos e em branco nessa área da cidade, para eleição de representantes da Câmara, chega a 30,86%.
O percentual é maior do que o registrado no Centro (29,74%) e na Zona Norte (24,17%). Os melhores índices estão na Zona Oeste (21%). Para se ter uma idéia, a diferença entre as zonas Sul e Oeste chega a quase 47%. Os dados foram obtidos a partir do cruzamento dos resultados das eleições de 2004. Naquele ano, em toda a cidade, cerca de um milhão de eleitores não participou da eleição para vereadores”.
Dessa reportagem vale a pena pinçar ainda:
“Presidente da Sociedade Amigos de Copacabana, Horácio Magalhães diz que um dos motivos para a desmotivação política do bairro é o desempenho dos vereadores.
Ele cita o caso recente da Câmara de querer aprovar um projeto renovando as concessões de linhas de ônibus sem consultar a população:
— O fato de termos mais acesso a informações explica a desmotivação da Zona Sul. No entanto, acredito que, cada vez que abrimos mão de participar desse processo, mais contribuímos para manter a situação como está.
Em Copacabana, bairro de Horácio, está a 18ª Zona Eleitoral, localizada na Rua Miguel Lemos. Lá, foi registrado o maior índice de abstenções: 25,45%. Também nessa rua houve o percentual mais alto de voto em branco para vereadores (5,28%). O votos nulos foram recordes na Zona Eleitoral da Rua Antônio Basílio, na Tijuca (7,6%), seguida da 18ª Zona, também na Rua Miguel Lemos (7,11%).
Na Zona Oeste, a média de voto em branco para vereador é de 3,6%. Já os votos nulos não passam de 3,98%. Há zonas eleitorais, como a da Avenida Cesário de Melo, em Santa Cruz, onde os votos nulos foram de apenas 2,65%, o índice mais baixo da cidade”.
Internet limitada
Além do terror que se apossa de um candidato, pela possibilidade de levar uma multa por descuido de algum colaborador no trabalho de rua, o voto de opinião é ainda bloqueado pela interpretação absolutamente descabida que a Lei e muitos magistrados dão à Internet, ao ponto de restringir o envio de cartas eletrônicas – mais conhecidos como e-mails – que têm alcance ilimitado e custo zero, ao contrário do que acontece com as malas diretas enviadas pelos correios.
Neste sistema, somando desde a impressão da carta até o selo, passando pelo envelope, etiquetas e pessoal remunerado, uma correspondência não sai por menos de R $ 2,50, o que a torna exclusividade de candidatos com mala cheia. Além disso, há um verdadeiro esquema de manipulação de cadastros oficiais, tornados privativos dos candidatos da máquina.
Segundo pesquisa do Ibope/NetRatings, o Brasil ultrapassou em junho a marca de 41 milhões 565 mil pessoas com acesso à Internet em qualquer ambiente, como casa, trabalho, escola, cybercafés e bibliotecas.
Considerando que o Brasil tem aproximadamente 184 milhões de habitantes, o número de internautas já equivale a 22,5% da população. Se esmiuçarmos o levantamento, poderemos detectar que em grandes cidades, como Rio e São Paulo, esse percentual já ultrapassou os 50%.
Como se infere da análise do cientista político Leonardo Barreto, da Universidade de Brasília, o leitor de uma mensagem eletrônica é provavelmente um cidadão com visão crítica, portador de um voto de opinião. “O público da internet é mais seletivo, em geral, mais instruído” – pondera.
Estamos, assim, diante de um quadro definido: ou há mais espaços para sensibilizar o voto de opinião ou teremos legislativos cada vez mais medíocres, viciados e corruptos.
coluna@pedroporfirio.com
2 comentários:
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