terça-feira, 19 de outubro de 2010

Direita comanda os dois lados - opinião de Ronald Barata, ex-presidente do Sindicato dos Bancários do RJ e militante do PDT

DEVAGAR COM O ANDOR

“Quero fazer uma análise mais profunda, porque estou convencido de que os períodos de Fernando Henrique Cardoso e o de Lula, se não são a mesma coisa, são parte de um mesmo projeto.” – Alain Touraine – sociólogo francês.

Tenho recebido muitas mensagens de companheiros(as) que se engajaram na campanha presidencial. Os ânimos estão exaltados. Um lado, apelando para baixarias, acusa que o outro é que está baixando o nível e vice-versa.
Para quem professa com convicção uma ideologia de esquerda, esse não é o caminho adequado. É preciso baixar a bola e, em vez de ataques, analisar a conjuntura nacional, o contexto internacional, os retrocessos e os avanços políticos havidos e o comportamento dos políticos e dos partidos desde a Constituinte.
Peço pois, licença para compartilhar uma reflexão, ainda carente de discussão com muitas(os) companheiras(os).
As candidaturas dos partidos de esquerda, que defendem os interesses da classe trabalhadora, infelizmente tiveram votação inexpressiva. Há mais de uma década, temos vivido um retrocesso político no país, devido a fragmentação das organizações da classe trabalhadora e a fragilidade da política de comunicação dos grupos de esquerda. As ideias conservadoras têm progredido perigosamente. Deveríamos fazer uma análise dos partidos políticos que limitam suas atuações às campanhas eleitorais e não fazem trabalho de organização e de formação política.
Quem luta pela implantação de uma sociedade mais justa no Brasil, com um regime econômico que, com soberania, desenvolva o país e distribua renda com justiça; por um regime político que propicie igualdade de oportunidades, cultura, educação, saúde, previdência digna, direitos trabalhistas, proteção à velhice, ao meio ambiente, democratização dos meios de comunicação, esses não podem alimentar a perspectiva de que avançaremos rumo ao socialismo com um desses dois candidatos e seus condomínios políticos no poder. Ou ainda, pensar que para a retomada das lutas, o candidato X será melhor do que Y; que um deve ser exterminado nas urnas, pois o outro será enquadrado com as lutas populares.
Temos que voltar os olhos para o futuro. Devemos ter uma perspectiva de atuação das esquerdas, mas é indispensável que as lideranças populares, seja em sindicatos ou em partidos ou outras organizações, mantenham coerência e independência de quaisquer governantes com o perfil dos que estão disputando as eleições.
A meu ver, os sindicalistas cooptados, os que se corromperam, são caso perdido. Se ganhar Lula, continuarão se locupletando na máquina pública. Se ganhar o outro, muitos desses “líderes” imediatamente aderirão ao novo governo. De todos porém, por desmoralizados, nada se pode esperar.
As esquerdas (os que não aderiram ou os que abandonaram o cipoal ideológico do governo Lula), devido ao processo eleitoral, estão diante de uma excelente oportunidade para construir unidade para a retomada das lutas populares. Organizar, politizar e mobilizar os trabalhadores urbanos (os rurais contam com bons instrumentos como o MST e a Via Campesina), os estudantes e outros segmentos. Isso não será com os dirigentes sindicais e estudantis que estão priorizando ocupação de espaços em governos.
Para mim, repito, é ilusão pensar que um desses campos que disputam as eleições, vão propiciar avanços para as lutas de emancipação dos trabalhadores, rumo ao socialismo. Essa briga na internet deveria considerar diversos aspectos, como:
Em termos de privatização, o governo FHC deixou um legado de traição, entregando até as entranhas da pátria ao privatizar a Vale do Rio Doce. Uma ignomínia que o governo Lula não procura reverter. Mas Lula também faz privatizações, tão indecentes quanto as de FHC. Ou não é privatização, doar recursos públicos a empresas nacionais e estrangeiras para aquisição de outras empresas ou para aumento de capital? E, pagando juros de 10,75% para captar, repassa ao BANDES que “empresta” à taxa TJLP de 6%. Fosse aplicado em algum investimento de infraestrutura, seria correto. Mas não é. Basta ver o socorro financeiro ao Banco Votorantin e as doações à Votrantin Papel e Celulose para comprar a Aracruz Celulose. Foram R$ 2,4 bilhões, sem contar a compra pelo BNDES de 49.99% do capital votante do banco, pagando o valor de todo o banco.
O escandaloso PROER do FHC precisa sempre ser condenado. Mas, e a farra que Lula faz com as empreiteiras, com os bancos públicos concedendo empréstimos subsidiados para compra ou criação de outras empresas? Passaram a atuar, além do seu ramo, em petroquímica, mineração, produção de etanol, exploração de óleo e gás, telecomunicações, gestão de rodovias com pedágios privilegiados, estaleiros, Seguros etc. Tudo a custa do bondoso BNDES, como o “affair” Telemar-OI-Brasil Telecom.
Para comprar a Brasil Telecom, a OI (que é sócia do Lulinha na Gamecorp) recebeu empréstimo de R$ 4,3 bilhões do Banco do Brasil e R$ 2,6 bilhões do BNDES. Lula, alterando a Lei de Outorgas, viabilizou a operação e a OI, de quebra, livrou-se de uma multa de R$ 490 milhões.
A JBS Friboi (carne bovina) entrou no mercado de capitais em 2007. Em 2005 adquiriu a Swift Armour Argentina; em 2007 a Swift Fieids & Co., dos EUA. Em 2008 a Inalca (Itália) e em 2009 engoliu a Tatiara Meat Company da Austrália. Lançou debêntures e o BNDES adquiriu 65% por R$ 2,2 bilhões. E mais: em 2009 o BNDES jogou na Bertin a fábula de R$ 5,7 bilhões, que logo depois foi comprada pela JBS, surgindo uma nova holding que comprou a Pilgrim”s Pride, com negócio nos EUA, México e Porto Rico. Para isso, lançou debêntures no total de R$ 3,4 bilhões e o BNDES comprou 99%. Essas operações não criaram sequer um emprego no Brasil. Há muitos outros casos.
A oligopolização do setor de supermercados começou com FHC e não parou nos últimos anos, inclusive com invasão de estrangeiros que engoliram redes nacionais.
Nenhum dos candidatos aborda aspectos da política econômica. Não se colocam contra a autonomia e independência do Banco Central; não falam nos aspectos danosos do câmbio flexível, dos juros, da dívida que já ultrapassou os R$ 2 TRILHÕES. Auditoria da dívida... ora, não vão mexer nos interesses dos banqueiros.
Sobre Previdência Social (principalmente gestão quadripartite), Convenção 158 da OIT, retomada do monopólio estatal do petróleo, Abertura dos Arquivos da Ditadura etc., tudo isso é tabu para eles. O famigerado Fator Previdenciário, criado por FHC, teve sua extinção vetada por Lula.
E quanto aos escândalos, que estão sendo tão citados? Vejamos:
Governo FHC: Anões do Orçamento, compra de votos para reeleição, precatórios, do DNER, Sudene, Sudam, Privatizações, Proer, Bancos Marka e Fonte-Cindam etc. etc.
Governo Lula: Mensalão, Sanguessugas, Dossiê Vedoin (crime eleitoral- contra José Serra), Caos do tráfego aéreo, Vampiros, Furacão, Navalha.....
FHC engendrou a Lei que permite leilões de bacias sedimentares. E fez quatro leilões. Lula realizou seis leilões.
Já recebi, várias vezes, e-mails com entrevistas do Ciro Gomes. Uma é a favor do PT. Foi uma enxurrada de correios! Outra entrevista é a favor do PSDB. Outra enxurrada. Quanto valor dão a esse indivíduo! Mas só quando é favorável.
Mas devemos também voltar os olhos para o Parlamento.
É bom que alguns senadores reacionários, ex PFL etc., não tenham sido reeleitos. Mas quem entrou em seus lugares? A Câmara dos Deputados, como o Senado, terá predominância reacionária. Vejamos:
A coligação governamental elegeu 311 deputados Terá maioria suficiente para alterações na Constituição. O PT terá 88; o PMDB, 79; o PR, 41; o PSB, 34; o PDT, 28; o PSC, 17; o PCdoB, 15; o PRB, 8, e o PTC, 1. Os partidos da coligação José Serra elegeram 112 deputados – 53 do PSDB, 43 do DEM, 12 do PPS e 4 do PMN. O PV elegeu 15, e o PSOL manteve três deputados. Outros oito partidos independentes obtiveram o seguinte resultado: O PP elegeu 41; o PTB, 21; o PTdoB, 3. PHS, PRP e PRTB elegeram cada qual 2, e PTC e PSL, 1. TRISTE QUADRO DO NOSSO FUTURO PARLAMENTO. Quantos parlamentares de esquerda? Prestem atenção ao quadro acima. É trágico!
Quem visa apenas o bem-estar social, os interesses das classes trabalhadoras, deve apoiar toda proposição que vá ao encontro dos seus princípios, parta a iniciativa de onde partir. Não deve aderir a qualquer governo ou candidatura, mas apoiar medidas que eventualmente estejam de acordo com suas ideias. Assim como não deve aderir a uma oposição sem finalidade, apenas oportunista.
Alberto Pasqualini ensinou: “Um partido que realmente propugna o bem-estar social e, especialmente, os interesses das classes trabalhadoras deve apoiar toda proposição sincera coincidente com as formulações de seu programa, parta a iniciativa de onde partir. Pode um partido não querer se corresponsabilizar em determinada administração; porém, jamais lhe será lícito enveredar pelo caminho da oposição sem finalidade. Um partido, pois, que pretende realmente representar e defender as classes trabalhadoras, deve seguir em uma linha construtiva e não negativista. Para ser construtiva não é necessário que demande o palácio do governo em busca de acomodações e arranjos políticos, ou que renuncie ao direito da crítica; para não ser negativista, bastará que, na solução de qualquer questão ou problema, se inspire unicamente nas diretrizes do seu programa e adote a atitude e a posição que o bem comum e os interesses coletivos aconselham”.
É realmente de direita um grupo que tem entre seus componentes os Srs. Armínio Fraga, Tasso Jereissati, David Zilberstajn, Demóstenes Torres, Kátia Abreu, FHC, Ronaldo Caiado, os Bornhausen, Marco Maciel e muitos outros que apoiam o Serra.
Mas, não são de direita também, o Henrique Meireles, o José Sarney, o Renan Calheiros, o Fernando Collor, Francisco Dornelles, Romero Jucá, Romeu Tuma, Jader Barbalho, e muitos outros, que apoiam a Dilma?
Vê-se que quem está bastante confortável é a Direita. Comanda os dois lados.
FHC quis eliminar Era Vargas. Certamente, por ser contra direitos trabalhistas e contra industrialização. LULA declarou que a CLT é o AI-5 dos trabalhadores.
Eu, pessoalmente, tive muitas experiências com o PT, embora nunca me tenha filiado a esse Partido. Coloquei um tijolinho na criação da CUT, em 1983, e participei de sua primeira Direção Nacional. Na CUT-RJ, exerci os cargos de Vice-Presidente, Secretário de Formação Sindical, Secretário Geral e Tesoureiro. Por não ser filiado ao PT, não podia ser presidente, embora fosse presidente do Sindicato dos Bancários, baluarte da construção da Central no Rio de Janeiro. Mas, quando dos descaminhos da Central, comecei a rebelar-me e passei maus pedaços que não convém, neste instante, comentar ou declarar. Mas não são os problemas dessa fase que me levam a adotar posição sobre candidatura presidencial. Apenas pude descobrir que essa organização não titubeia em transpor a fronteira da criminalidade para se impor. Mas, crimes hediondos o PSDB também os pratica.
Mas pretendo patentear que as esquerdas devem se preparar para serem oposição em qualquer governo que venha a assumir e não gastar tanto tempo discutindo quem é o mais sujo.
Entendo que deve-se compreender as razões tanto dos que votarão na Dilma, dentre estes muitos valorosos companheiros. Mas também não demonizar os que não acompanharão essa posição. Dentre os que defendem Serra, há muitos brilhantes companheiros que devemos respeitar, como o Jackson Lago, por exemplo, que tem brilhante folha de lutas pelas causas populares e contra o Império da família Sarney.
A terceira posição, também respeitável é de ANULAR; protesto legítimo de quem não está satisfeito com nenhum dos candidatos. Afinal, anular voto para cargo executivo, diferentemente de anulação para Parlamento, é PROTESTO contra o status quo. Não se escarnecer companheiros que tomam essa posição, como o excelente Plínio de Arruda Sampaio.
Em 17 de outubro de 2010

RONALD SANTOS BARATA

P.S. – O sociólogo Francisco de Oliveira, emérito professor da USP e um dos fundadores do PT (saiu em 2003), em entrevista à Folha de S.Paulo no último dia 16/10, com a autoridade que possui, faz afirmações que todos deveriam procurar conhecer. Lembra que Lula declarou nunca ter sido de esquerda e mostra porque é ilusão pensar que Lula é estatizante e declara: “Lula, mais que Fernando Henrique, é privatista numa escala que nunca o Brasil conheceu.” E eu lembro: Acessem o site da Auditoria Cidadã da Dívida.

Só a estrutura socialista resolverá os problemas da humanidade . Brizola