quinta-feira, 24 de janeiro de 2008

Pesquisas, ambições primárias e lições da história

De acordo com Childs (1967), qualquer estado de opinião pública está em constante transformação, e o mecanismo eleitoral só pode dar informação periódica e um tanto bruta com respeito a essas mudanças. Professor Sérgio Roberto Trein, no estudo O duplo papel das pesquisas eleitorais: eleitora de quem está na frente, adversária de quem está atrás Com as últimas decisões do STF e do Tribunal Superior Eleitoral, os partidos ganharam um enorme peso no regime representativo, tornando-se, de fato e de direito, donos dos mandatos eletivos. Isso sugere uma contrapartida na mesma proporção, com o aumento da responsabilidade de cada legenda em relação à população hoje muito cética e aos destinos da administração pública. Num país de 30 partidos que se confundem nas siglas, nos seus “programas” e nas suas práticas, sobretudo quando estão no poder, o entendimento do que seja o processo de escolha de um governante e dos parlamentares não pode limitar-se a referenciais de superfície. O Estado do Rio de Janeiro, como todo o país, é pródigo e maus exemplos no hiato entre o aspirar e o chegar ao poder. Os governantes são tomados de uma síndrome da redoma e passam a ser mais ou menos inaccessíveis. Sem exceção, tornam-se maiores dos que os partidos e indiferentes aos eleitores que em alguns pontos lhes facilitaram a vitória. Não há registro nos regimes republicanos de governantes que renunciem ao monopólio da verdade, principalmente onde os corpos partidários são meras legendas, sujeitas aos sopros do primeiro minuano. O poder pelo poder Por todos os séculos, o que moveu os políticos e os partidos foi a busca cega do poder: ganhá-lo, nele permanecer ou a ele retornar, como definiu muito bem Mário Vargas Lossa, após a derrota que sofreu nas eleições presidenciais de 1990, que surpreenderam com a vitória do até então desconhecido agrônomo Alberto Fujimori. Isso repete a vulnerabilidade da classe política, de vida cíclica e liderança efêmera. Aquele que acumula força e forma uma base sólida tende a ser visto como ditador, palavra maldita numa sociedade em que os eufemismos garantem que todos são iguais perante a lei e, portanto, todos têm direito de sonhar com o poder que massageia seu ego, torna seu semblante mais senhorial e pode garantir o futuro dos seus até a décima geração. Fora os revolucionários que expõem suas vidas em longas marchas, são raros os governantes que se sentem missionários, como já pilheriava o Marquês de Maricá, ministro do Império, para quem muitos se dizem dispostos a morrer pela Pátria, mas preferem viver às custas dela. Essa cultura de poder como um grande negócio pode ser uma “verdade” para alguns, durante algum tempo, enquanto as sociedades forem respondendo a seu modo, cada um em sua classe social, aos problemas que se apresentam no cotidiano. Infelizmente, porém, é a idéia de que nada é mais compensador do que uma fatia do poder que move os políticos, guia os partidos e, o que é mais grave, influencia os eleitores. Estes são facilmente capturáveis e dão tão pouca importância ao direito de escolha que, em sua maioria, chegam a esquecer dos candidatos que mereceram seus votos nas eleições anteriores. A possibilidade de que a massa crítica seja cada vez mais insignificante acaba pesando nas decisões dos partidos políticos e na superposição de forças paralelas, como a mídia e o judiciário. A este o sistema republicano reserva hoje poderes para além dos imaginados pelo barão de Montesquieu quando preconizou a independência da Justiça. Enquanto o judiciário tudo pode pelo exercício da interpretação e pela prática dos processos, que chegam a perpetuar liminares por mais absurdas que sejam, no âmbito da mídia há um produto que ganha força cada vez maior – a pesquisa que, na maioria dos casos, tem objetivo mais indutivo do que informativo, como se queixava Brizola até seu último suspiro. Os limites das pesquisas Os profissionais de pesquisas são altamente preparados e sabem o que obter numa consulta antes mesmo de realizá-la. Da mesma forma, dispõem de metodologias que lhes permitem informar aos clientes do verdadeiro resultado colhido, independente da divulgação que façam para a leitura do grande público. A eles não se pode responsabilizar pela precipitação dos que se valem de pesquisas, sem considerar sequer a época em que são feitas. O povo, de um modo geral, tende a escolher em certo momento as pessoas mais conhecidas ou até mesmo os governantes, que estão sempre no proscênio. Na última pesquisa do IBPS, que se consolida como uma alternativa de avaliação até pela exuberância de suas informações, os dados mais importantes, que infelizmente nossos jornalistas e políticos não lêem estão na constatação de que 73,8% dos consultados disseram que não sabem em quem votarão para prefeito no pleito de outubro, enquanto 82,1% afirmam não terem candidatos a vereadores. O trabalho é abrangente e distribuído de forma correta entre áreas da cidade e faixas etárias. Ele serve para sustentar o óbvio: a consulta induzida, quando é apresentada ao eleitor uma relação de possíveis prefeitáveis, é um mero indicado, usado indevidamente para sugerir favoritos. Há estudos abundantes sobre opções antes do início do processo eleitoral, todos convergindo para declarar o seu caráter meramente fortuito e condicionado por fatores que nada têm com as expectativas dos eleitores em relação ao cargo consultado. Nessa etapa, pesquisas como a do IBPS servem como instrumentos de consultas pelos próprios aspirantes e pelos partidos, na medida em que apresentam problemas que mais angustiam à população. Mas não é lícito, por exemplo, imaginar que um prefeito vá resolver o desafio da segurança pública, algo que está tão internalizado no inconsciente coletivo que tem levado pessoas a atitudes absolutamente paranóicas: outro dia, um carro pifou no meio da serra Grajaú-Jacarepaguá e, como estava em frente à favela da Cotia, o casal preferiu descer de marcha ré até um lugar que considerasse mais seguro. Foi o suficiente para que o pânico se estabelecesse e todos os outros motoristas manobrassem nervosamente de volta, como se ocorresse um “arrastão” naquele momento. A questão do poder não pode ser tratada pelos partidos, agora mais robustos, embora cartorialmente, na leitura superficial de algumas pesquisas. Não fosse pela lição de Brizola no pleito de 1982, mais inesquecível foi o vexame que Fernando Henrique Cardoso passou, em 1985, quando posou para uma revista na cadeira de prefeito de São Paulo, às vésperas das eleições, e acabou derrotado por Jânio Quadros. Quero dizer com tudo isso que já é hora dos dirigentes políticos passarem do primário para o ginásio e pensarem menos em suas ambições e mais nos interesses públicos.

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